Após um tempo tendo o material desse sistema nos meus arquivos, decidi começar a jogá-lo num momento que não estava querendo fazer algo grande e trabalhoso. Como Ronin é um sistema simples e com aventuras curtas, decidi jogá-lo.

Aqui trago o resultado da aventura. A narrativa é mais simples do que trago no meu diário de Herança de Cthulhu, pois é o que anotei conforme jogava, mas sem contar as rolagens (coloquei no drive a versão completa das anotações, com fichas e rolagens). Mesmo assim, espero que gostem.



Introdução

Hansuke Shishido vivia com sua família num vilarejo tranquilo nas proximidades das montanhas. Ele havia aprendido com seu pai as técnicas do uso da kusarigama, apesar deste em quase todas as situações preferir a conversa ao invés do combate. De certa forma,  a técnica era uma tradição de família. Certo dia, seu pai ficou doente e não demorou muito para vir a falecer. Seu último pedido ao filho mais velho era que este cuidasse e protegesse a mãe e de seus dois irmãos.

As coisas começaram a ficar difíceis, não apenas pelo luto, mas financeiramente também. Estava cada vez mais difícil pagar os impostos ao Daimiô, mesmo com ele e sua mãe trabalhando duro e o segundo mais velho dos seus irmãos tentando ajudar.

Houve um momento em que eles pretendiam sair do vilarejo, no entanto, quando isso chegou aos ouvidos do clã samurai que comandava a região, os Usagi, o resultado foi terrível.

Eles foram traídos por alguém que devia ser “amigo” da família. Este deu tal informação apenas por dinheiro e por conta disso, a família Shishido foi atacada.

Hansuke tentou lutar, porém perdeu a consciência durante o combate e quando acordou, o sangue estava tingindo a neve de vermelho. Sua mãe e seus irmãos estavam mortos.

Capítulo 1 – Andarilho

Passou-se algum tempo desde a morte de sua família. Apesar da culpa que carrega por não ter conseguido salvar ninguém, Hansuke Shishido decidiu seguir em frente, andando de cidade em cidade. Nem havia muita escolha, não existia mais um lar para ficar e não gostaria de saber o que aconteceria se os Usagi descobrissem que ele sobreviveu. De certa forma, depois daquele incidente, ele apenas queria ter algum propósito ou ao menos fazer algo para se redimir de sua falha.

O caminho pela estrada estava quase deserto. Ao andar pelas proximidades de uma floresta, Hansuke percebeu alguns movimentos e assim que parou apareceram dois assaltantes de trás de algumas árvores. Estes portavam facas e exigiam que ele entregasse algo de valor. Ele fez um sorriso sereno dizendo “sou só um andarilho, não possuo nada”. Os bandidos deram um riso de deboche e o atacaram.

O primeiro deles avançou na direção de Hansuke, ele deu dois passos para trás enquanto pegava sua kusarigama e ao descer um pouco o peso da porta da corrente ele girou e enrolou uma das pernas do oponente, o fazendo tropeçar e logo em seguida o deu um golpe nocauteando-o.

O segundo achou que estava na vantagem por Hansuke estar distraído com seu parceiro, mas este esquivou de seu golpe e rapidamente desenrolou a corrente de sua arma, em seguida ficou girando a ponta. O bandido faz uma expressão de confusão, aparentemente nunca viu essa arma antes. Tentou avançar, mas ao erguer o seu braço para atacar, este foi preso pela corrente de Hansuke, o bandido tentou reagir, mas rapidamente o ronin usou a foice de sua arma para tirar a faca do oponente do caminho e deixar o bandido indefeso, logo em seguida Hansuke o deu uma joelhada e logo em seguida outro golpe que fez o bandido ficar inconsciente.

Com os dois oponentes no chão, ele recolheu sua arma e sem muita cerimônia continuou seu caminho.

Ao caminhar mais um pouco, finalmente chegou na cidade de Onnaji. As coisas no local pareciam estar tranquilas, percebia alguns soldados rondando pela área, mas não chegou a chamar muita atenção desnecessária.

Pela razão de que não teria como chegar na cidade seguinte antes de anoitecer, ele procurou algum lugar que pudesse passar a noite possuindo tão pouco dinheiro. Nisso ele encontrou uma hospedagem vinculada a um bar, o local era barulhento, mas era o melhor que encontrou.

Quando terminou de resolver as coisas com a dona do lugar, decidiu passar um tempo bebendo, nisso, pouco tempo depois apareceu um homem de cabelos vermelhos que o chamou a atenção. Este parecia ser conhecido de algumas pessoas do bar e foi chamado de Ryuu.

Ryuu tinha uma personalidade bem amistosa, a primeira situação de conversa com Hansuke foi engraçada por confundí-lo com uma mulher, mas após um tempo de papo as coisas ficaram um pouco melhor. Ryuu não falou muito de si mesmo, além de que cuidava de algumas pessoas doentes e assim como Hansuke estava de passagem, apesar de ser conhecido na cidade.

Eles trocaram ideia mais algumas vezes durante a noite. Com o pouco dos braços que eram amostra, veio a mente de Hansuke que Ryuu seria alguém forte na batalha, mas Ryuu negou, afirmando que apenas cuidava de umas pessoas doentes.

― Hu, sei como é uma pessoa pacífica assim. ― ele abaixou um pouco o olhar para seu copo ― meu pai era desse jeito…

― Aconteceu alguma coisa?

― Só-

De repente a frase dele foi interrompida quando entraram no bar dois caras que pareciam discutindo e reclamando. Quando se virou, eram os dois bandidos que o atacaram na estrada. Eles olharam para ele com os olhos arregalados e logo em seguida recuaram para fora do bar. Todos os presentes olharam para ele por alguns segundos tentando entender a reação deles, depois deixaram isso de lado.

― Amigos seus?

― Hum… Eles tinham tentado me roubar na estrada e… Apaguei eles. Não esperava reencontrá-los tão cedo.

― Pera! Me conta isso aí direito!

Hansuke resumiu a situação do confronto. Ryuu ficou impressionado com a descrição da facilidade que Hansuke teve para derrotá-los. O questionou porque os deixou vivos e Hansuke apenas deu de ombros dizendo que não sentiu que valeria a penas matá-los.

Depois de alguns segundos em silêncio, eles pediram mais uma rodada e mudaram de assunto. A noite foi longa até o cansaço tomar conta e todos irem para seus quartos dormir.

Capítulo 2 – Perturbações

O seu corpo estava quase todo dolorido e seus pés afundavam na neve fofa. Ele a carregava em seus braços o mais junto possível de seu corpo, e sua respiração era ofegante não apenas pelo desespero que estava sentindo como pelo cansaço.

“Por favor… Aguenta, por favor… Só mais um pouco…” ele sussurrava.

O caminho descendo a montanha não parecia ter fim, ele apenas andava e andava, até tropeçar e cair de joelhos. Seu corpo ficou rígido, não conseguia mais se mover, ainda mais quando percebeu que não estava sentindo a respiração dela.

Ele arregalou os olhos e dirigiu o olhar pro rosto da pessoa que estava carregando, assim viu uma figura pálida de sua irmã caçula.


Hansuke acordou de súbito num grito e, ao olhar ao redor e perceber que estava na estalagem, suspirou e tentou se recuperar do que acabara de acontecer. Ele estava com algumas lágrimas nos olhos, então as secou e respirou um pouco. Logo em seguida juntou suas poucas coisas para ir embora.

Antes de partir, ele chegou a encontrar Ryuu tomando um café da manhã e este o cumprimentou. Hansuke retribuiu com um leve sorriso e um aceno de despedida e em seguida seguiu sua viagem.

Caminhando por baixo do sol que estava mais quente que no dia anterior, Hansuke avistou uma subida ligada à estrada e logo adiante era possível avistar um templo. Ele pensou por alguns segundos, até que decidiu seguir por esse caminho. Andando pela pequena trilha com alguns degraus de pedra que guiam para o templo, Hansuke encontrou um monge que aparentemente cuidava do lugar. Parecia que era óbvia a perturbação no espírito de Hansuke, pois o monge o convidou para meditar no templo por alguns dias. Hansuke aceitou a proposta, pois acreditava que isso o faria bem. 

O tempo passou rápido e quando percebeu se passou uma semana. Em algumas vezes ainda vinha em sua mente os seus conflitos internos, porém esse tempo foi o suficiente para refletir. Hansuke precisaria ficar mais forte para poder evitar passar por outra perda e dor que passou naquele dia.

Ao final da semana, Hansuke se viu pronto para seguir seu caminho. O monge gentilmente lhe ofereceu um pouco de suplemento para sua viagem e o informou que a próxima cidade, caso ele continuasse seguindo a trilha, era Naha. 

Naha é uma pequena cidade. Ao andar pelas ruas, Hansuke ouviu as pessoas conversando e uma delas mencionar Hanako Oonishi. Ele não pôde evitar voltar sua atenção a essa conversa, ela era uma mulher com extrema habilidade em kenjutsu e era uma mestre muito conhecida. Ao menos é o que ele ouviu falar. De qualquer modo, Hansuke ficou muito interessado em saber onde encontrar Hanako.

Perguntando para algumas pessoas, não foi difícil encontrar um pequeno dojô onde o informaram que Hanako era a principal mestre. Ao chegar lá, ele encontrou  um homem alguns anos mais velho que ele e o perguntou sobre ela. Este respondeu que Hanako não estava. Hansuke tentou conseguir informação de onde ela se encontrava e que queria que ela o treinasse, porém o homem respondeu:

― O dojô Oonishi não é para qualquer um, ainda mais um andarilho. Vá embora.

― Por favor, me deixe ao menos falar com ela.

O homem desembainhou a espada dele, apontou para Hansuke dizendo que não iria permitir e novamente o mandou ir embora. Hansuke tentou insistir novamente, porém um pouco mais atento à sua kusarigama e como esperado o homem fez um movimento com a espada, porém Hansuke a bloqueou com a foice de sua arma.

A luta com o oponente foi mais difícil do que esperava, a situação de ambos estava quase empatada e Hansuke estava começando a ficar perdido nos movimentos do oponente, até que ele percebeu uma abertura, se esquivou do ataque do inimigo e deu um golpe deixando o adversário caído no chão. Em seguida ele recolheu sua arma.

De repente ele percebeu uma senhora na faixa dos 60 anos, com algumas manchas na pele e da qual ele não sabia a quanto tempo estava observando a luta deles.

Hansuke ficou por alguns segundos sem reação, até que ela silenciosamente se aproximou do homem que estava caído, para analisar o estado dele e notou ele fazer um leve grunhido de dor. Logo em seguida ela perguntou:

― Qual o seu nome, rapaz?

― Hansuke Shishido. Eu… Me desculpe por isso. Voc- Digo, a senhora-

― Por que estava me procurando?

― A senhora é conhecida pela sua habilidade no kenjutsu. Apesar de não ser nada parecido com as habilidades que possuo, quero aprender a arte da luta com a espada.

― Por quê?

― Quero me tornar mais forte, senhora. Quero ser capaz de derrotar quem for necessário e proteger quem eu precisar.

Houve alguns minutos de silêncio. Hanako analisou Hansuke nesse tempo, conseguia ver sinceridade em suas palavras. Ela finalmente disse:

― Bom, se está disposto a aprender o que tenho a ensinar, precisará de uma espada.

Durante os dias de treinamento, Hansuke percebeu que o cara que derrotou não ousou aparecer no dojô nos dias que ele passava lá para treinar. Fora isso, nos momentos de pausa ele tentava conversar com Hanako de assuntos além de apenas combate e o treinamento, porém ela parecia uma pessoa meio rígida e fechada, não gostando muito de falar de assuntos mais pessoais.

No entanto, ela chegou a deixar escapar que o “filho” dela havia ido embora um tempo atrás por desentendimento entre ambos. Ela mencionou que o nome dele era Ryuu e de imediato isso chamou a atenção de Hansuke. Ele a disse que o havia encontrado uns dias atrás, com isso ele ficou um pouco empolgado e surpreso por conhecer ambos.

Porém, aparentemente não foi uma boa ideia tocar nesse assunto e ela não quis se alongar nisso. Seja qual for o motivo, Hanako não queria falar mais nada sobre o relacionamento dela com Ryuu, então nos próximos dias, apenas o treinamento foi o foco.

Capítulo 3 – Conflitos

Após o tempo de treinamento, que se totalizou alguns meses, Hansuke ficou pronto para seguir seu caminho. Hanako era um tanto durona, mas a prova dela ter se simpatizado com Hansuke foi ela ter deixado ele levar uma katana ao partir. Quando for necessário, usar o que aprendeu será útil.

Depois de um tempo na estrada, sem grandes acontecimentos no caminho, Hansuke se viu em Tóquio. Ele nunca passou por uma cidade tão grande e movimentada antes. Era facilmente possível notar que a cidade era comandada pelo clã Kaeru, pelos símbolos do clã estarem presentes em alguns lugares e no traje de alguns soldados.

De repente, no meio de toda a agitação dessa grande cidade, ele percebeu que algo estava acontecendo em um beco e seguiu nessa direção para saber o que era.

Assim que se aproximou, Hansuke percebeu que a confusão era Ryuu sendo atacado por alguém. Ele gritou “Ei!” chamando a atenção da pessoa. Hansuke fez um olhar sério e ameaçador girando o contrapeso de sua kusarigama encarando o inimigo.

A pessoa ao vê-lo, arregalou os olhos. Mesmo estando com uma faca em mãos e podendo enfrentá-lo, este ficou assustado e saiu correndo. Hansuke ficou levemente confuso por tê-lo afugentado tão fácil, mal sabia ele que o que aconteceu em sua jornada estava começando a se espalhar.

Ele se aproximou e ajudou Ryuu a se levantar e assim este imediatamente o reconheceu. A ficha não havia caído a princípio por causa da espada que Hansuke estava carregando.

― Shishido! Não acredito!

― Huhu, eu quem o diga. Faz um bom tempo. Como você se meteu nessa situação?

― Bom… Às vezes a cidade grande é mais perigosa do que se imagina. Esse cara queria me roubar.

― Imaginei. Bom, quer beber alguma coisa?

― BORA!

Eles encontram um lugar para comer e beber. Hansuke conversa com Ryuu como se ele fosse um amigo próximo que conhece desde anos. De certa forma é bom conversar com ele.

Num momento Ryuu finalmente mencionou a espada de Hansuke, estava curioso e queria saber sobre isso já que fazia um bom tempo desde a última vez que se viram. Hansuke percebeu onde isso iria chegar e se demorou um pouco mencionando que passou numa pequena cidade onde vivia uma espadachim muito habilidosa, com isso ele a procurou para que ela o treinasse.

 ― Bom, não vou enrolar muito mais. Passei por Naha e conheci Hanako Oonishi.

Ryuu arregalou os olhos e logo em seguida mudou de expressão, desviando o olhar.

― Ela chegou a mencionar você. Mais ou menos. Ela não gosta muito de conversar.

― Hu, nisso não mudou nada…

― O que aconteceu entre vocês? 

Ryuu ficou alguns segundos quieto, até que decidiu dizer. Ele não era de fato filho dela, apenas foi criado por ela quando era criança, já que o único parente que ele possuía era seu avô e ele estava muito velho para cuidar dele o tempo todo, porém o relacionamento dele com Hanako não era dos melhores, principalmente pela personalidade rígida e durona dela. Num momento, bem depois do avô dele ter falecido, as coisas ficaram “piores que o normal”, então ele decidiu ir embora de Naha.

― Não digo que ela era uma pessoa ruim, só um pouco amargurada, a gente vivia brigando, ela queria que eu seguisse o caminho da espada, mas eu nunca quis isso… Como se não bastasse, sempre fui péssimo em luta apesar do meu físico e ela ficava “Ah, seu marica! Você não consegue nem sequer sacudir uma espada! Capaz de morrer tropeçando numa mosca!”, he he… Ela era muito difícil. 

― Daí você foi embora por isso?

Ryuu deu de ombros e continuou:

― Eu preferia mais cuidar das pessoas do dojô quando havia alguém que passava dos limites, com isso percebi que o melhor para mim era fazer isso e não a violência. Ela não entendia isso, aí quando fiquei de saco cheio peguei minhas coisas e fui embora. Na época realmente fiquei bem irritado.

― Entendo… Dá pra imaginar como deve ter sido complicado.

― É, mas já passou ― Ryuu tomou mais uma dose do seu sake e disse ― Hu, Não sei se ela mudou um pouco ou você tem um talento pra deixar alguém mole, pra aquela cabeça dura falar de mim depois de todos esses anos… Mas, sei lá, dá pra a gente encerrar esse assunto por aqui e não falar mais nisso?

Hansuke pôde ver um olhar meio perdido em Ryuu, então apenas concordou. Eles mudaram de assunto e após poucos minutos com o clima levemente pesado a conversa voltou a ser descontraída.

No entanto, parece que a tranquilidade não durará muito tempo.

Capítulo 4 – Reconhecimento

Após as ocorrências em Tóquio, Hansuke novamente seguiu seu caminho. Já está virando um hábito isso de seguir de cidade em cidade independente do que ocorra. O deixa um pouco intrigado encontrar duas pessoas com uma relação como aquela. Lhe vem um pouco em mente se haveria a chance de eles se reencontrarem e se reconciliarem.

O clima nesse dia estava um pouco mais ameno, porém, de repente, apareceram três pessoas com porretes se movendo ao seu redor e com isso Hansuke se viu cercado. Novamente pessoas na estrada querendo acabar com ele. Avaliando com o olhar o porte físico dos inimigos, Hansuke avaliou que dessa vez era melhor agir diretamente com a espada. Agir na defensiva poderia não dar muito certo.

O primeiro avançou na direção dele. Hansuke avaliou seu movimento, se esquivou e logo em seguida fez um corte sobre o peito do adversário. Quando este faz uma expressão de dor, Hansuke o atingiu com a parte de baixo do cabo da espada e o deixou inconsciente

― Quem é o próximo?! ― Hansuke falou alto com um olhar sério e encarando os outros.

― Ah, merda! É Hansuke Shishido! Só pode ser piada, ninguém falou que também tinha uma espada!

A pessoa que falou isso abaixou o porrete e recuou dizendo pro outro para irem embora, porém Hansuke perguntou de onde ouviram falar dele.

― Isso não interessa! Acha que é o bonzão por derrubar uns fracotes que encontra por aí, é?!

Esse parecia ser um pouco mais forte que os outros, ou pelo menos mais determinado, no entanto Hansuke tentou usar o fato de saberem das habilidades dele ao seu favor e apenas respondeu “Então vai querer TENTAR me derrubar ou vai me deixar em paz?”

O homem o encarou por alguns segundos, logo em seguida suspirou e mandou o outro o ajudar a carregar o que estava inconsciente para irem embora.

Hansuke nunca parou para pensar que suas ações seriam reconhecidas, ainda mais ao ponto de seu nome ser conhecido. Ao chegar em um porto e decidir descansar pelo local, o veio em mente o que poderá acontecer dali em diante.

Capítulo 5 – Fúria

Nesse dia o céu estava levemente nublado e a estrada quase deserta. Quando estava passando nas proximidades de um arrozal, Hansuke percebeu duas pessoas cercando uma terceira que utilizava uma máscara de kitsune. Pelos trajes, imediatamente ele percebeu que aquelas duas pessoas eram samurais do clã Usagi. Estes estavam de armadura e portando katanas.

Na distância que eles estavam, não o notaram, de qualquer modo, veio um arrepio em sua espinha e lembranças daquele dia que sua família morreu. Ele não conseguiu fazer nada, apenas fracassou e perdeu a todos. Hansuke tremeu um pouco, estava com uma mistura de medo e raiva. É certo que se o reconhecerem ele poderá morrer, mas ele não poderia deixar eles matarem aquela pessoa inocente.

Quando um dos samurais se preparou para erguer sua espada, Hansuke o impediu acertando o objeto com sua kusarigama e fazendo a katana escapar da mão dele. O samurai o encarou e o rosto dele era levemente familiar. Foi possível notar o samurai abrir a boca para perguntar quem era, mas ao ver Hansuke, girando o contra-peso de sua corrente, este não parecia surpreso.

― Ora, então é por aqui que você tem andado, Shishido.

― Sabia que iriam saber quem sou eu… Deixem essa pessoa em paz.

― A gente tá fazendo nossa obrigação.

― Akira ― disse o seguindo pro primeiro ―  para de perder tempo!

“Não, ele não tava lá…” Hansuke pensou ao ser mencionado o nome do samurai que estava conversando.

― É um saco, eu poderia estar fazendo coisa MUITO melhor… Mas é o que tem que ser feito. ― Akira falou enquanto despreocupadamente pegava sua espada no chão.

― Repugnante. ― sultou Hansuke com visível olhar de desprezo.

― É, talvez um pouco. Ouvi muito falar de você, os boatos circulam rápido. ― de repente Akira fez um sorriso provocativo ― Principalmente sobre o trabalho que tivemos que resolver, em relação à sua família. 

― Cale a boca… ― Hansuke falou entredentes.

― Nem sei os detalhes, não é na minha área… Mas pena que só sobrou você. Se tivesse sobrado uma das mulheres, seria mais interessante.

― EU FALEI PRA CALAR A BOCA!!

Hansuke avançou com tudo contra Akira. O samurai colocou o braço na frente quando o mais jovem girou o contrapeso da corrente contra ele e quando este ficou enrolado Akira puxou a corrente ao mesmo tempo que posicionava a katana contra Hansuke. Por pouco, Hansuke conseguiu manter a estabilidade de sua arma e bloquear o golpe com a foice da Kusarigama, travando a rota da espada e evitando ser ferido.

Eles recuaram. O samurai avançou e Hansuke desviou do golpe ao mesmo tempo tentando atacá-lo novamente. Estavam próximos de mais, então Hansuke usou a foice para atingi-lo, com isso foi o suficiente para os dois se ferirem ao mesmo tempo assim com Hansuke possuindo um corte no braço que estava escorrendo um pouco de sangue e Akira com um ferimento próximo do ombro, que apesar da armadura era possível notar um pouco de sangue no local.

Hansuke o encarou com um olhar sério, girando o contrapeso da Kusarigama enquanto analisava o inimigo para dar o próximo ataque. Ele avançou novamente, mas de novo o samurai usou a corrente dele a seu favor, com isso o puxou e deu uma joelhada em seu estômago, porém, antes de Akira atingi-lo com a espada, Hansuke o deu uma rasteira, derrubando-o no chão e logo em seguida desferiu um golpe com a ponta da foice na região da garganta dele.

― Droga, seu maldito! ― esbravejou o outro samurai assim que Hansuke se levantou.

Hansuke estava levemente ofegante, não achava que teria energia para desviar de algum outro golpe. Ele se moveu, contornando o outro samurai e ficando entre ele e a pessoa mascarada. Ele disse alto para ela:

― Fuja daqui. AGORA!

Ele deixou sua kusarigama de lado e sacou a katana, encarando o outro samurai. Foi possível notar a pessoa mascarada seguir o que ele disse, antes do samurai avançar na direção de Hansuke, obviamente tomado pelo ódio da morte de seu parceiro.

O samurai moveu sua espada contra Hansuke, enquanto este bloqueou o golpe. O inimigo tentou acertá-lo novamente, Hansuke conseguiu se abaixar e atingi-lo no abdômen com sua espada.

O samurai cuspiu um pouco de sangue que chegou a sujar um pouco a roupa de Hansuke, porém não teve forças para fazer nenhuma outra reação. Este caiu no chão enquanto Hansuke caiu de joelhos.

Ao mesmo tempo que ele suspirava de alívio por ter saído vivo, o sangue no local o fazia lembrar daquele dia. Ao menos dessa vez, não era de alguém inocente o sangue que ele via no chão.

― Você está bem?

Ele ouviu uma voz feminina e suave, então ao levantar o olhar percebeu que era a pessoa que ele ajudou. Devido à máscara e as roupas, não sabia que era uma mulher.

― Estou… Achei que já estivesse longe, hu.

― Me preocupei um pouco, hehe ― Ela pegou a kusarigama dele no chão e o entregou enquanto continuava a falar ― Tome, Shishido…?

― Hansuke. Hansuke Shishido.

― Certo. Me chamo Yoshihime Teruno. Melhor sairmos daqui, daí posso cuidar dos seus ferimentos. É o que posso fazer para agradecer.

― Ok…

Após se afastarem do local do confronto, Yoshihime ajudou  Hansuke com os seus ferimentos. O corte no braço era o mais profundo, porém estancando o sangramento não haveria muito problema.

A noite caiu e eles montaram um acampamento. Yoshihime não possuía muito problema em falar de si mesma, apesar de dizer que não havia nada muito interessante para se contar. Hansuke resumiu parte de sua história, enquanto ela dizia a dela. Yoshihime havia sido criada por um médico numa pequena cidade e estava seguindo para uma cidade um pouco distante para conseguir uns medicamentos com um velho amigo dele.

No dia seguinte, foi possível seguir juntos o caminho por um tempo, até chegarem numa encruzilhada e se separarem.

As coisas ficarão de fato mais perigosas por Hansuke ter matado aqueles samurais. Ele encontrou uma área de pescadores e se instalou por lá, para ao menos ter um local tranquilo para ficar, não apenas para se recuperar de seus ferimentos, como também dar um tempo da estrada.

Capítulo 6 – Reputação

Após um caminho sem incidentes na estrada, Hansuke chegou em Osaka. Não bastou muito tempo para reparar dois soldados o encarando. Algumas pessoas na rua passaram por ele antes dos soldados se aproximarem. Hansuke estava com mal pressentimento, mas não queria lutar nesse momento.

Um dos soldados foi direto em querer confirmar quem ele era de fato e Hansuke foi sincero e confirmou.

― Não queremos confusão por aqui. Arruaceiros do seu tipo só trazem problemas.

― Eu não vou criar confusão com quem me deixar quieto. Tenho certeza que não vai acontecer nada se vocês me deixarem em paz.

Os soldados se entreolharam, aparentemente eles sabiam que poderiam ser derrubados facilmente por Hansuke e um deles apenas o disse “ficaremos de olho em você” antes de darem meia volta e voltarem às suas obrigações.

“Ainda bem que não deu em nada” Hansuke pensou.

Andando pela cidade, Hansuke passou por um estabelecimento, parecia uma casa de chás, porém o que chamou a sua atenção era um homem de cabelos brancos, apesar de jovem, com uma katana na cintura que estava na porta a princípio distraído até notá-lo.

O homem cumprimentou Hansuke e brincou perguntando se ele era “o cara que estava criando confusão com os guardas”, mas Hansuke negou que queria confusão e eles só haviam conversado. Ele tentou desviar desse assunto se apresentado, logo em seguida o homem respondeu dizendo se chamar Toshiro Musashi. Hansuke o perguntou se ele lutava, já que a espada foi o que o chamou a atenção.

Toshiro confirmou que sim, apesar de por hora ter se estabelecido com o comércio e não tem lutado faz um tempo.

― Apesar de que quando aparece um espertinho tentando roubar ou dar um calote isso acaba sendo útil.

― Hu hu, imagino.

Eles conversaram um pouco. Toshiro parecia ser alguém determinado e um tanto capaz de lutar para defender o que considerava o certo. Após alguns minutos, ele educadamente pediu pro Hansuke deixá-lo trabalhar e este o fez, já que reconhecia que realmente estava tomando o tempo dele.

Ao se retirar, Hansuke notou facilmente que havia alguém o observando. Dessa vez o veio um mal pressentimento.

Capítulo 7 – Perseverança

Passaram uns dias desde sua passagem em Osaka. Hansuke estava com uma sensação ruim desde que saiu de lá e seus pesadelos o tem pertubado um pouco. Por conta da última noite mal dormida, ele decidiu sair da hospedagem onde estava ainda de madrugada.

Estava tudo um tanto calmo, mas ao mesmo tempo desconfortável, no entanto, quando estavam nascendo os primeiros raios de sol, ele avistou uma pessoa em uma ponte que estava em seu caminho.

Ao olhar por alguns instantes, ele percebeu quem era.

Um homem de cabelo azulado amarrado num rabo de cavalo, utilizando uma armadura do clã Usagi  e com duas Kama visíveis em sua cintura. Hanzo Usagi. Esse homem é um dos que estava lá naquele dia.

― Ora, finalmente te encontrei. ― Disse Hanzo, com o olhar distraído para o nascer do sol ― Esse horário do dia é extremamente magnífico. Pássaros começando a cantar, algumas flores desabrochando… É perfeito para acabar com um certo assassino.

Hansuke colocou a mão sobre sua katana. Ele lembra bem do pouco que viu da capacidade de combate de Hanzo, ele é muito rápido.

― Olha só quem fala.

― Eu estava cumprindo o meu dever, quanto a você, além de matar membros do clã que não tinham nada a ver com seus assuntos mesquinhos, não passa de uma criança patética que teve sorte de sair vivo naquele dia. Você pode deixar que eu resolva as coisas do jeito fácil ― ele pegou suas kamas ― ou do jeito difícil.

Hansuke desembainhou sua katana e encarou Hanzo com um olhar sério.

― Hu… Já era o esperado.

Hanzo avançou na direção de Hansuke. Ele se movimentava rapidamente com as kamas, o ronin recuou alguns passos conforme o inimigo tentava acertá-lo, até que um golpe por muito pouco não o atingiu, com Hansuke colocando a espada entre as lâminas das armas de seu inimigo e seu rosto.

Hansuke deu um chute para afastar Hanzo de perto dele. O inimigo fez um leve sorriso e avançou novamente. Hansuke ficou encurralado pela lateral da ponte e novamente bloqueou um golpe que por muito pouco não o atingiu. O metal da espada em contato com as lâminas das kamas faziam um atrito que tornava possível notar que as mãos dele estavam tremendo.

Novamente, Hansuke o afastou, porém logo em seguida soltou sua katana e pegou a kusarigama. Ele estava com medo e não estava conseguindo se concentrar manipulando a espada.

“Eu não posso perder! Eu não posso perder!”

Hansuke girou o contrapeso de sua arma e atacou uma vez após a outra, enquanto Hanzo tentava evitar ser atingido ou se esquivando ou posicionando uma de suas kamas para desviar a ponta da corrente. De qualquer modo, Hanzo não se permitia ficar para trás. Mesmo Hansuke girando a ponta da corrente para atacar ou ficar na defensiva, Hanzo era capaz de chegar muito próximo de acertá-lo. 

Hansuke precisava ganhar essa batalha. Essa era a técnica que seu pai lhe ensinou e não apenas isso, ele tinha que acabar com esse cara, precisava ser capaz de derrotá-lo.

Seus pensamentos o deixaram fora do foco no combate. Hanzo conseguiu chegar próximo o suficiente de Hansuke, o desferiu um corte no abdômen que o fez recuar. Logo em seguida, Hansuke tentou revidar, mas em vão. Hanzo conseguiu segurar a corrente da kusarigama, Hansuke arregalou os olhos, poderia perder a arma nesse momento, porém, sem pensar duas vezes, com a outra mão ele segurou firme a corrente da kusarigama para esta não escapar e com a foice dela desferiu um corte no rosto de Hanzo.

O Usagi recuou com a mão no local e antes que pudesse reagir, Hansuke o deu um chute na barriga que o fez recuar e cair da ponte.

Hansuke, ofegante, voltou a si e pode ver o seu inimigo boiando na água. Ele lembrou das palavras dele, o chamando de assassino por ter matado aqueles dois samurais do clã Usagi.

― Ah… Não acredito que vou fazer isso… ― Hansuke resmungou.

Ele recolheu as suas armas e as kamas dele, que haviam caído. Hansuke seguiu o rio e a corrente não era muito forte, com isso não demorou muito pro corpo de Hanzo parar na margem. O ronin checou e percebeu que o homem estava respirando. Um lado de Hansuke estava com uma grande vontade de matá-lo, mas nesse caso, deixá-lo com a vergonha de perder pra um mero camponês sem um teto seria uma punição adequada. Hansuke deixou as Kamas do Usagi ao lado dele e logo em seguida seguiu seu caminho.

Pouco tempo após o começo da tarde, Hansuke chegou em Sapporo. Ele estava um pouco despreocupado pelo estado que se encontrava após o último conflito, por tal razão isso chamou a atenção de um guarda que se moveu na direção dele.

No entanto, quando Hansuke o encarou, o guarda sentiu um arrepio. Era evidente que, apesar dos leves ferimentos, era uma péssima ideia lutar com ele, então o guarda recuou sem dizer nada. Apesar de ser levemente vantajoso ser conhecido e isso levar a evitar que pessoas tentem lutar contra ele, era um pouco desconfortável essa atenção desnecessária.

Ao encontrar um local para fazer uma pausa e comer, uma garota o chamou a atenção. A princípio Hansuke estava na defensiva, sua mente ainda estava um pouco agitada, mas não aparentava que a garota faria algum mal.

Kagami é bem mais nova que Hansuke, mais ou menos da idade de um de seus irmãos. Ela o confessou que ouviu bastante falar sobre ele, apesar de que quando o avistou não tinha certeza se era ele de fato.

Eles conversaram por um tempo. Além da leve admiração e dos boatos sobre ele, Kagami chegou a comentar que havia passado pela cidade um andarilho que havia causado muita dor, mas que atualmente estava arrependido. Ela disse não se recordar do nome da pessoa, apenas que conversar com ele a lembrou disso.

Logo após esse tempo de conversa, Kagami se despediu e se afastou, seguindo na direção de algumas pessoas que à primeira vista parecia ser a família dela. Bateu em Hansuke uma leve saudade quando viu essa cena, ao mesmo tempo, ele estava curioso em saber quem era a pessoa que Kagami havia mencionado. Pode ser que no futuro ele descubra.

Capítulo 8 – Força

Dessa vez, Hansuke foi surpreendido por uma enorme chuva e por estar no meio de uma extensa estrada deserta, não havia onde se abrigar. Ele seguiu seu caminho levemente incomodado com isso, até que de repente ele percebeu que havia logo adiante alguém se aproximando. Hansuke pôs-se em alerta para lutar com seja lá quem for, pois ele percebeu que a pessoa estava com uma naginata em mãos. Antes que ele pensasse em alguma coisa, a chuva se intensificou um pouco mais e a pessoa sumiu de sua vista. Quase não foi possível perceber a tempo, mas ele conseguiu se esquivar de um rápido movimento de lâmina que ocorreu à sua esquerda. Hansuke pegou sua kusarigama e se colocou na defensiva.

― Oh, errei. ― Falou a pessoa com sua Naginata apontada pro nada. 

― Quem é você?

― Pode me chamar apenas de Nobu. E você é… Hansuke Shishido, correto?

Ele olhou na direção de Hansuke, mas de certa forma o olhar dele parecia levemente vago. Isso deixava Hansuke intrigado. Ele não sabia “qual era a desse cara” e sentia que já ouviu esse nome em algum lugar .

― E o que você quer?

Nobu se moveu rapidamente, os movimentos dele eram quase totalmente precisos, porém Hansuke conseguiu com a foice da kusarigama bloquear o ataque.

― Um homem chamado Yuzuki me contratou por um bom valor para acabar com você. É só isso que preciso contar, hu. 

Hansuke conseguiu fazer um movimento para forçar o bloqueio e fazer seu inimigo se afastar. Nobu continuou falando:

― Já tinha ouvido uns boatos sobre você. Vejamos se é forte como dizem.

“Contrataram esse cara pra me matar. Por que será que não estou surpreso? Bom, de qualquer modo, se esse cara é um mercenário, talvez tenha sido em alguma cidade grande que ouvi sobre ele.”

Hansuke avançou contra Nobu. Ele fez uns movimentos com a kusarigama tentando atingi-lo, quando chegou muito próximo de acertar, Nobu colocou a ponta da naginata sem lâmina na trajetória do contra-peso, impedindo de atingi-lo. Hansuke tentou avançar novamente, mas Nobu atacou ao mesmo tempo e suas armas se chocaram. Logo em seguida eles se afastaram, e dessa vez Nobu atacou, fazendo um corte superficial no braço de Hansuke.

Hansuke aproveitou sua posição e novamente atacou. Dessa vez ele foi muito rápido, Nobu quase não conseguiu se esquivar do ataque e foi atingido pelo contrapeso, mas foi num ponto onde não era crítico o suficiente para ele perder a consciência.

Hansuke estava começando a se cansar e apesar da chuva era possível notar que seu inimigo estava se cansando também. Pensou se valeria trocar para a katana e dar-lhe um golpe certeiro, mas ele respirou fundo e decidiu continuar com a kusarigama até o final.

Ele avançou contra Nobu, estava disposto a derrubá-lo, porém o movimento do inimigo foi além do previsto, ele girou sua arma e ambas de chocaram. Hansuke estava ofegante, vinha em sua mente a chance de perder, no entanto, ele lembrou de tudo que passou até chegar nesse ponto. Ele sentiu que devia vencer essa luta e acabar com o homem que mandou matá-lo.

Nobu o atacou, Hansuke girou o contra-peso da sua kusarigama, enrolando a corrente na naginata, logo em seguida, se moveu ao redor do inimigo enrolando a corrente no pescoço dele, assim o deixando sem reação. Logo em seguida, Hansuke desferiu um golpe que o deixou inconsciente.

Logo após isso, ao invés de satisfeito com essa vitória, ele sentiu uma leve mistura de frustração e cansaço. Ele tem encontrado com frequência inimigos muito fortes e os mais fracos nem ousam se aproximar dele e o é questionável se tudo que tem feito valeu a pena.

Após a chuva ter cessado e perto de anoitecer, ele encontrou um porto e decidiu procurar algum lugar para descansar. Dessa vez decidiu que ficaria um tempo a mais, pois estava extremamente cansado.

Capítulo 9 – Medo

Aquele sonho do qual Hansuke anda na neve carregando alguém de sua família ainda o assombrava, dificultando um pouco suas chances de ter um sono tranquilo. Depois de uns dias no porto, não apenas recuperando energia, mas também de seus leves ferimentos resultantes do último combate, finalmente ele criou coragem de seguir seu caminho. Dessa vez ele teme por sua vida e sente que poderá perdê-la a qualquer momento, porém, está disposto a dar tudo de si até o fim.

A luz da lua o permitiu estender um pouco mais o seu caminho. A brisa suave tomava conta de tudo e podia se ouvir um som característico quando o vento passava entre os bambus da área que ele estava andando.

De repente Hansuke ouviu alguém se aproximando, dessa vez não estava surpreso, cedo ou tarde alguém apareceria para enfrentá-lo, ainda mais num lugar como esse. Parecia bem planejado, esses bambus poderiam atrapalhá-lo no momento de girar sua corrente.

Ao se virar, ele avistou um homem de cabelos brancos de tamanho médio e vestido apenas com uma calça, além de possuir uma tatuagem em um dos braços. Possuía um ar misterioso e aparentemente o estava esperando faz um tempo. Hansuke de imediato pressentiu o perigo, mas antes que se preparasse para enfrentá-lo, o homem fez um gesto de negação e disse “eu não faria isso se fosse você”.

O homem se moveu mais pra dentro do bambuzal, Hansuke o seguiu reparando numa enorme cicatriz nas costas desse homem e em poucos segundos, ele pôde avistar uma pessoa amarrada e amordaçada da qual reconheceu imediatamente. Era sua mestre da arte da espada, Hanako Oonishi.

― Passei em Naha esses dias para trazer uma convidada. ― Ele falou passando a mão perto do rosto de Hanako ― Depois da incompetência de Nobu, fui obrigado a agir por contra própria.

― Então você é “Yuzuki”.

Ele sorriu como resposta, determinado como um “sim”. Hansuke o mandou deixá-la em paz e perguntou o porquê dele estar fazendo isso. Yuzuki apenas respondeu que Hansuke estava atrapalhando os seus planos, confessou que as coisas pareciam ser mais fáceis, mas ele o subestimou. De certa forma, Yuzuki estava por trás de vários incidentes que Hansuke encontrou no caminho. Alguns coincidência, outros nem tanto, como os samurais do clã Usagi que atacaram Yoshihime.

Ele disse que tem monitorado algumas coisas por trás e reconheceu o quanto Hansuke era “fraco”. Yuzuki se moveu para junto de Hanako e desafiou Hansuke a enfrentá-lo.

Para Hansuke estava evidente a estratégia de Yuzuki. Ele não tinha como atacá-lo sem a chance de atingir sua mestre. Ele olhou para ela, logo em seguida para sua kusarigama, que estava junta da katana. Ele não poderia fazer isso, ela não era “apenas sua mestre”.

Hansuke se rendeu, se colocando de joelhos e deixando suas armas no chão. Conforme Yuzuki se aproximava dele, Hansuke só conseguia pensar “me desculpe, mestre.”

De repente, tudo ficou escuro.


A neve de novo, espessa, atrapalhando seu caminho. Estava difícil caminhar. O seu corpo dolorido, mesmo assim a carregando.

“Por favor, aguente. Aguente. Não morra!”


Hansuke acordou de súbito, gritando, e imediatamente sentiu uma enorme dor na região do seu peito.

― Droga! Assim você vai abrir seu ferimento!

Hansuke tentou respirar um pouco e se situar do que estava acontecendo. Havia uma leve luz amarelada de uma fogueira e próximo desta uma máscara de kitsune, então ele ergueu o olhar e olhou pro rosto de quem estava junto dele.

― Yoshihime…

― Parece que dessa vez sou eu que te salvei. ― ela sorriu, mas depois mudou a expressão para de preocupação ― Estava passando pela trilha e o encontrei caído perto daqui. O que aconteceu? Do jeito que estava sangrando poderia ter morrido.

Veio à mente de Hansuke  as últimas coisas que lembrava e ele fez uma expressão de tristeza. Ele contou a Yoshihime sobre as ações que Yuzuki estava por trás e que ele estava com Hanako como refém. Ele se sente um tanto fraco por ter preferido não lutar ao invés de acabar com ele, mas naquela situação, ele não poderia fazer nada. De novo ele não poderia fazer nada.

Yoshihime tentou animá-lo e incentivá-lo a não desistir nessa situação. Ele precisava seguir em frente e deter Yuzuki, pois se este tentou afetá-lo, isso significa que só Hansuke seria capaz de impedir o “algo maior” que ele planeja.

De certa forma Hansuke reconhecia que ela estava certa, mas por outro lado ele continuava não se sentindo tão bem com toda essa situação. Ela o aconselhou a descansar um pouco para poder pensar melhor e partir para a cidade mais próxima no dia seguinte, para se recuperar. Ele aceitou a ideia, mas mesmo com o cansaço, foi difícil cair no sono.

No dia seguinte, Hansuke estava disposto a seguir para a próxima cidade. Como era o mesmo caminho que estava indo, Yoshihime andou junto com ele até chegarem num pequeno vilarejo. Veio em Hansuke uma pequena nostalgia encontrar um local pequeno e simples como sua terra natal. Yoshihime decidiu conversar com as pessoas para saber se alguém precisava de alguma ajuda e Hansuke procurou algum lugar para descansar. Como ele nem sequer reagiu, Yuzuki não teve o mínimo remorso de desferi-lo um ferimento tão grave.

Passou-se um tempo, Yoshihime foi a primeira a partir, ela queria ficar um pouco mais, mas Hansuke insistiu para ela ir, dizendo que ficaria bem, apesar de que por dentro ele não ter total certeza disso.

Capítulo 10 – Tristeza

Seguindo para a próxima cidade, Hansuke reparou que estava numa área de domínio dos Usagi. Ele teve um sentimento bem ruim, ainda mais que pelo o que lembrava sobre esse lugar, era de domínio do clã Kaeru. Pelo visto, o território foi dominado recentemente.

Ele avistou um samurai do clã Usagi e não houve o que fazer, quase de imediato este o percebeu e foi em sua direção. Hansuke queria se desvencilhar de alguma forma, até mesmo se fazer de sonso, mas não houve outra, o samurai sacou a katana e avançou em sua direção.

Hansuke a princípio tentou mantê-lo afastado girando o contra-peso da sua kusarigama, porém o samurai conseguiu se aproximar dele e Hansuke usou a foice de sua arma para evitar ser atingido pela katana do samurai.

Logo em seguida, ele deu um chute afastando o samurai de perto dele e sentiu uma dor na região de seu ferimento. O samurai julgou que estava na vantagem por Hansuke estar visivelmente sentindo dor, mas o ronin não deixou isso o atrapalhar. Assim que seu inimigo avançou novamente, Hansuke o atingiu com o contra-peso na região das costelas e logo em seguida deu um chute e atingiu novamente o samurai com a ponta da corrente.

O samurai ficou inconsciente no chão e Hansuke apenas se virou e se afastou do local antes que chamasse mais atenção para si do que já chamou. 

Capítulo 11 – Calmaria

Apesar da confusão que se meteu, Hansuke conseguiu encontrar na cidade um lugar para se instalar e terminar de se recuperar. Uma ou outra pessoa parecia o reconhecer, cochichar entre si das coisas que ele fez. Ele enfrentou inimigos em seu caminho, ajudou outras pessoas e foi treinado por uma mestre de grande nome que era Hanako Oonishi.

Hanako… Hansuke se questionava um pouco se ela estaria bem, pois naquela situação que encontrou Yuzuki com ela, ele teve medo de feri-la. Enquanto isso, aquele homem está controlando pequenos crimes por aí. Alguma hora ele terá que encontrá-lo e acabar com aquele homem.

O caminho adiante não possuiu nenhum incidente relevante, porém, ao chegar na próxima cidade, Hansuke percebeu um exército de soldados. Dessa vez de um clã que ele pouco ouviu falar, os Kuroneko. Mesmo não sabendo muito sobre eles, além de ser um clã que surgiu a pouco tempo depois do clã Yorutako ser reduzido a nada, a única certeza que possuía é que não iria querer confusão com esses caras.

Hansuke se restringiu a se instalar numa hospedaria em uma área que não cruzaria o caminho com eles. Chega de confusões com os clãs nobres.

Capítulo 12 – Confronto

No tempo em que estava hospedado, de repente uma criança se aproximou de Hansuke e lhe entregou uma carta. Quando a criança se afastou, ele a leu. Era de Yuzuki, dizendo para encontrá-lo numa praia deserta próxima ao nascer do sol. Hansuke pensou em Hanako e de certa forma tinha ciência que não apenas Yuzuki não o deixaria em paz como poderia fazer coisas muito piores, então na noite daquele dia ele preparou o necessário para enfrentá-lo.

Na madrugada, ele seguiu em direção ao local, refletindo das várias coisas que ocorreram durante a sua jornada. Ele chegou numa praia e ficou alguns minutos sobre uma pedra olhando pro mar e o sol nascendo no horizonte, até que ele percebeu passos se aproximando dele.

Ele encarou Yuzuki e como esperado ele estava com Hanako. Hansuke tentava manter um olhar sério, mas uma parte dele ainda carregava receio. Yuzuki encarava com deboche a situação. Se via levemente surpreso por Hansuke ter se recuperado rápido, mas ameaçou dizendo que dessa vez arrancaria a cabeça dele se o ronin se recusasse a lutar.

Hansuke suspirou e sacou sua katana, logo em seguida saiu da pedra e se moveu ao redor deles. Enquanto isso tentou conversar para saber mais sobre Yuzuki e tentar descobrir alguma abertura. Ele não disse quase nada de relevante, parecia perceber que Hansuke pretendia usar algo contra ele, mas Yuzuki se mantinha intangível. 

Após isso, Yuzuki se posicionou e ambos foram para cima com tudo.

Hansuke estava ainda muito preocupado e não teve precisão em seus ataques. Ao contrário dele, o primeiro ataque de Yuzuki foi muito rápido e preciso e fora da técnica que Hansuke esperava. Ele teve tempo de desviar, mas afastado pode logo perceber um corte em sua roupa e um bem superficial sobre sua pele. Ele tremeu por dentro.

Hanako, que não estava amordaçada dessa vez, gritou para Hansuke não se preocupar com ela, que era para usar tudo de si e derrotar aquele covarde. Hansuke suspirou e tentou atacar novamente.

Yuzuki tentava atacar Hansuke novamente, mas este se esquivava. Hansuke conseguiu se posicionar e atacou, porém Yuzuki consegui se movimentar rápido o suficiente para puxar Hanako e colocá-la em sua frente, fazendo o ronin atingi-la. Hansuke ficou paralizado por alguns instantes, ao encarar sua espada com o sangue de sua mestre. Tudo ao seu redor parecia escuro e ele não ouvia coisa alguma, nem o riso e provocações de Yuzuki.

Ele não podia perder, pois caso contrário tudo seria em vão, então no instante que voltou a si, Hansuke conseguiu se mover para bloquear o ataque do seu inimigo. Ele o encarou com um olhar de fúria e após afastá-lo um pouco se preparou para o próximo ataque. 

Passou em sua mente as lições que Hanako o ensinou sobre analisar o oponente, saber as ações e movimentos certos. Alguns dos ataques de Yuzuki passaram perto, mas Hansuke era capaz de se esquivar. Na abertura que ele conseguiu notar, de imediato Hansuke moveu a katana fazendo um corte sobre o peito de Yuzuki e logo em seguida um chute o derrubando no chão.

Yuzuki tentou se levantar e se desviar do próximo ataque, porém Hansuke foi rápido e o atacou com tudo, Yuzuki rolou para o lado, pôs-se de pé e tentou atacar Hansuke novamente, mas dessa vez o ronin colocou a espada no caminho e penetrou seu estômago antes que o atingisse.

— Era isso que você queria, NÃO É?!

Yuzuki fez uma expressão de dor e não foi capaz de dizer nada além de expelir um pouco de sangue pela boca. Ele caiu no chão, ainda com a espada encravada em si e Hansuke respirou um pouco o encarando, até se virar e correr para ver como sua mestre estava.

Hanako estava respirando, mas muito fraco e estava perdendo muito sangue. A cidade mais próxima não era perto o suficiente para ele pedir ajuda, então ele não podia fazer nada. Não demorou muito para ela parar de respirar e seus olhos se apresentarem vazios. Hansuke levou um tempo para assimilar tudo isso e criar coragem de mover o corpo dela onde havia terra mais firme, fora do alcance da maré, e pegar sua espada.

Após lavar o sangue em suas roupas e na espada, ele arrumou um lugar onde poderia cavar e enterrá-la. Ele fez esse ato quase que no automático, não estava se sentindo bem nesse momento, pois a que custo foi derrotar Yuzuki? Custou a vida de sua mestre, que, apesar da personalidade um tanto difícil, ele simpatizava.

Após arrumar o local da maneira que podia e cuidar do corpo dela, Hansuke deixou junto do túmulo improvisado a sua espada, que Hanako havia lhe dado quando ele terminou seu treinamento, era o que podia fazer nesse momento. Ele ficou um tempo sentado junto do túmulo por um tempo, precisava superar um pouco isso tudo e decidir o que faria agora.

Capítulo 13 – Caminho

Há uma grande movimentação pelo porto desse pequeno vilarejo litorâneo, com trocas de encomendas e pessoas entrando e saindo desse pequeno país que é um compilado de ilhas. Hansuke estava nesse lugar um pouco pensativo de tudo que passou até chegar nesse momento.

Apesar de ser reconhecido por sua força e ter ajudado algumas pessoas e estas terem criado simpatia por ele, talvez algumas de suas atitudes tenham sido mais egoístas do que nobres, incluindo as vidas que tirou. Ele pensou bastante na escolha que faria depois de ter derrotado Yuzuki e alguns incidentes causados por influência dele terem cessado.

Hansuke sente que as coisas que fez não foram o suficiente para compensar as perdas que teve nem de torná-lo forte como queria, então ponderou sobre isso e decidiu que seguiria para outro continente em busca de uma nova vida. Ao menos indo para onde ninguém nunca ouviu falar dele traria a possibilidade de ter um pouco de tranquilidade.

Assim que avistou um barco pronto para partir, ele entrou na embarcação e se escondeu entre algumas mercadorias. Seria possível seguir a viagem sem ser notado.

Sabe-se lá o que o futuro levará de agora em diante, mais ao menos o que passou jamais sairá de sua mente.